Onde você estava em setembro de 1993? Consegue
lembrar-se de algo que tenha lhe marcado tanto? Como era o mundo há 20 anos?
Perguntas difíceis de responder, mas há exatas duas décadas, o mundo recebia
uma obra-prima composta por uma das bandas mais populares daquela época, o
Nirvana. Naquele mês de setembro, entre o final do verão e início de outono no
hemisfério norte, fim de inverno início de primavera no sul, onde está o
Brasil, recebíamos em nossas lojas o novo disco, tão aguardado, "In
Utero".
Claro que àquela época não tínhamos tanto
dinheiro para sair comprando discos, eram tempos muito difíceis em nosso país,
desemprego, recessão, inflação fora de controle, governo que tentava encontrar
alguma saída para uma nação a beira da falência e com muitos jovens sem
esperança no futuro que se tornava cada vez mais presente.
As dores de amor, da alma, as crises existenciais,
tudo isso fazia parte do dia a dia de muitos adolescentes. A chegada do novo
disco do Nirvana trazia algo que falava diretamente a grande parte dessas
pessoas, pois era um disco 'sujo', agressivo, um grito de socorro com
microfonia, guitarras distorcidas, vocais melancólicos e letras que falavam
muito sobre sofrimento de várias espécies, entre espiritual e físico.
Foi com esse disco que muitos moleques da
época passaram a entender o que era rock, que o Nirvana mostrou do que era
capaz e de quanto a banda era boa. Brigas com gravadora, agentes, gravações
feitas no melhor estilo de banda de garagem, álbum feito para "não
vender". O título original seria um soco na cara de muitos "I hate
myself i want to die" [eu me odeio e quero morrer], mostrava o quanto Kurt
não estava nada satisfeito com sua fama e com o "zilhão" de cobranças
que recebia. A gravadora barrou e depois de muitas reuniões chegaram ao título
final "In Utero".
Não é necessário dizer que assim que chegou às
lojas o álbum “tomou” de cara o primeiro posto nos mais vendidos e gerou muitos
comentários entre críticos e fãs. As letras eram ainda mais ácidas do que as de
"Nevermind" e "Bleach". Em uma delas, logo na primeira
faixa, "Serve the Servants", ele cita: "a angústia adolescente
deu bom lucro, agora fiquei chato e velho". O primeiro single do disco foi
"Heart shaped box", onde ele afirma que "queria poder devorar
seu câncer quando seu corpo ficasse roxo" e em outra parte grita
"jogue para baixo seu cordão umbilical para que eu possa subir de
volta".
A letra mais polêmica foi da quarta faixa,
"Rape me" [Me estupre]. "Me estupre, me estupre meu amigo, me
estupre, me estupre de novo, me odeie, faça e repita", cantava Kurt sobre
melodia que tinha seu estilo de composição, guitarra limpa, suja, sussurros e
gritos desesperados. Em outra faixa, "Francis Farmer will have her revenge
on Seatle", o vocalista abre o refrão com "sinto falta do conforto de
ficar triste".
Entre idas e vindas, entre o som brutal,
nervoso, com vontade de destruir o mundo, há canções calmas, com pitadas de
depressão e melancolia. Para resumir, em todo tom triste do álbum, dá para
sentir que ele é tão bom quanto os outros, ou até melhor, depende de como você
está no dia em que o coloca para ouvir. Neste mês, esta obra completa duas
décadas, e ele soa tão atual como poucos, pois a angústia e a revolta fazem
parte da natureza humana, goste você ou não.