Uma banda de Campinas, com nome em latim e com diversas influências de bandas de rock dos anos 80 e 90. A Radiare esta desde 2006 batalhando seu espaço no mercado independente, apresentando-se em festivais e em casas de shows e no ano passado lançou seu primeiro álbum. Para saber mais da banda, nós do zine/blog Canibal Vegetariano conversamos com Fabrício Frebs (guitarrista e vocalista), que falou um pouco sobre a história e o futuro do grupo.
Canibal Vegetariano: Para começarmos peço que você apresente a banda. Nomes dos integrantes, instrumentos e tal.
Fabrício Frebs: Radiare é formado por Fabrício Frebs, guitarra e voz, Maurício Strückel, voz e guitarra, Victor Peres, baixo e voz, e Paulo Magalhães, bateria e voz. Frebs participou, no passado, das bandas Astromato e Captador, e hoje também toca contrabaixo na Máquina Voadora. Mau Strückel também é guitarrista da banda Del-O-Max. Paulo tocou bateria também na Astromato, Juli Manzi e na Captador, e hoje também assume a guitarra e vocal na banda Nüer, na qual Victor também
toca como baixista. Ah, dava para montar um Festival só com nossos projetos paralelos, eh eh.
CV: Quando e onde começou a banda Radiare? E qual o significado do nome?
FF: Radiare começou de fato em 2006, numa iniciativa minha e do Paulo em voltar a tocar. Tínhamos tocados juntos na Astromato, depois na Captador, e após o fim dessas bandas ficou sempre a sensação de que poderíamos continuar a tocar, pois a afinidade sonora era grande. Então, após algum tempo, eu mostrei a ele algumas canções que tinha gravado em casa e logo iniciamos os ensaios, já com o Victor no baixo. Achamos que deveríamos dar um nome à banda pouco tempo depois, quando
o Maurício chegou e enxergamos que poderíamos criar uma personalidade sonora ali. Sobre o nome, Radiare vem do latim, se relaciona à emissão, irradiação de energia, luz, calor, radiação. Eu sempre gostei de significar como uma explosão de energia, espírito em forma de som, como algo incontrolável, espontâneo, puro, sem filtros. No nosso caso, são quatro personalidades fazendo isso através de uma banda de música. A letra de Radio Espírito explica um pouco Radiare.
CV: O som de vocês lembra o power pop do final dos anos 80 início de 90. Quais as principais influências da banda?
FF: Acho que as influências vão mudando bastante, ao longo da vida. Pelo menos para mim, não são as mesmas hoje e quando eu tinha 20 anos. Alguns grupos me motivaram muito a querer ter uma banda. New Order, Teenage Fanclub, Pixies, Beatles, My Bloody Valentine... São inúmeras bandas de movimentos e cenas de época principalmente nos EUA e Reino Unido que mexeram com a minha cabeça de moleque. Tenho um carinho grande por essa época, por essas bandas. Hoje, às vezes me sinto um pouco deslocado nesse nicho de "banda de rock", como se isso restringisse as possibilidades e tornasse a banda caricata, quando na real eu só quero me expressar através da música, em geral. Mas para os tempos atuais, fiquei muito tempo viciado em Elliott Smith. Hoje, estou ouvindo alguns sons dentro do jazz, Joe Pass, The Bad Plus, Ron Carter, Jim Hall. Também gosto de choro, Ernesto Nazareth, instrumentais brasileiros. Também alguns sons pouco comerciais, sem formatos padronizados, artesanais. Não sei exatamente como isso pode transparecer na música que faço, mas acho que a mistura de tudo o que me influencia transparece na minha personalidade. Quanto ao resto da banda, acredito que todo mundo goste bastante de rock mesmo.
CV: Como é fazer rock, considerado mais tranquilo, em um País que se têm batucadas e parte dos adolescentes veneram bandas que tocam algo mais agressivo? Quem é o público do Radiare?
FF: É curioso. Quando vou dizer a alguém que tenho uma banda "de rock", grande parte das pessoas reage imaginando que tenho uma banda de heavy-metal ou punk. E quando vamos tocar por aí, muita gente torce o nariz porque nosso som é muito "leve" e não demonstramos muito da tradicional atitude roqueira que a grande mídia caricatura como rock, algo cheio de fogos de artifício como Kiss, ou hoje em dia no Brasil, o emo do NX Zero. Daí, fica vago explicar o que fazemos e criar uma
identificação, criar um público, se não for pela própria música. O que, por sinal, deveria bastar, não? Mesmo a cena rock que formou as bandas que me motivaram a ter banda, há15 anos, já estão no passado e nada significam para a maior parte das pessoas que que estão por aí. Então acredito que estamos formando um público novo, formado por pessoas diversas, com suas personalidades próprias, e não pegando todo um nicho pronto, que já gosta de outras bandas parecidas. Talvez fosse mais fácil entrar num estereótipo de banda que já existe, e já ser lançado a um grupo fechado de público. Mas a idéia não é essa. Vamos fazendo o nosso som. O País tem muita gente, muitas personalidades. Tenho notado quando tocamos e quando recebo algum feedback do CD que as possibilidades de público para nós são muito amplas. Desde adolescentes até uma galera que já passou dos 30. Mas não está fechado, pronto, óbvio.
CV: Como foi o processo de gravação do album de vocês e como ele está sendo recepcionado pelo público e mídia?
FF: Queriamos gravar há um bom tempo já, mas queriamos algo de qualidade, diferente das experiências de gravação que tínhamos tido até então, que iam mais para o estilo "ensaio gravado", isto é, tempo cronometrado, sem planejamento, com o Paulo (nosso batera) conhecendo o equipamento 5 minutos antes de gravar. Não queríamos mais isso. Daí conhecemos o Maurício Cajueiro. O Kju trabalhou vários anos em Los Angeles, em grandes estúdios, e acumulou uma bagagem ótima na área de produção musical. Conversamos com ele sobre o que queríamos e fechamos a gravação de 8 músicas. O processo todo foi bem bacana, como se durante esse tempo o Kju fosse o quinto membro da banda. Ele pegou as músicas antes, demos, foi aos ensaios, mexeu em algumas músicas, sugeriu alterações em letras, métricas, timbres, efeitos, enfim, nos apresentou a um estilo de “produção” que não tinhamos vivenciado até então. Desde o dia em que gravamos o primeiro material bruto até os discos ficarem prontos passou-se um ano. Tudo foi feito com muita calma e liberdade. Gravamos em três estúdios diferentes, e aos poucos, sempre ouvindo e trabalhando o material. O importante era que ficasse bom, profissional, fosse criada uma unidade, e a gente se identificasse com o resultado. Tudo isso rolou. A recepção ao álbum está sendo boa. Lançamos de forma independente, toda a correria é nossa, então depende muito da nossa disponibilidade para fazer a promoção do disco. Por isso, o processo é lento. Mas saíram matérias bacanas em veículos importantes, como a Tramavirtual e a MTV. Recebemos comentários positivos de muita gente. Viabilizamos
através do selo Midsummer Madness (www.mmrecords.com.br) uma parceria boa para distribuição agora em 2010, com a Tratore (www.tratore.com.br), que disponibilizará o disco para grandes lojas. Mas o principal, que era ter um material de qualidade gravado e acessível, já conseguimos. O CD está aí, disponível, e fundamenta bases para sermos reconhecidos como uma banda séria.
CV: E shows, como está a agenda? Vocês fazem restrições para tocar em algum local ou que o show seja com bandas de outros estilos?
FF: Nossa agenda está até que tranqüila. Sempre temos shows marcados, mas está longe do atropelo de uma banda com gravadora e agentes correndo atrás. Tocamos com mais frequência em Campinas mesmo. Não temos restrições de lugares ou outras bandas não. Mas nunca rolou nada tão estranho, de sermos chamados para um evento como uma festa de peão ou um batizado, por exemplo. Mas seria bem curioso.
CV: Falando em shows, peço que você comente sobre a apresentação que vocês fizeram na Livraria Cultura em Campinas, durante o Auto Rock. Como foi tocar em uma loja e no formato acústico?
FF: Foi bacana a experiência. A Livraria Cultura, todos os funcionários com quem tratamos na organização do evento foram muito interessados, atenciosos e profissionais. Considerando que somos uma banda de Campinas, iniciativa cultural local, obtivemos um ótimo apoio para nosso trabalho. Inclusive com a comercialização do disco. Nem todas as lojas de grande porte desse segmento são receptivas ao trabalho de artistas independentes. O show, em si, foi interessante. Tocamos num auditório, com as pessoas sentadas assistindo, como num teatro. Isso foi estranho, pois criava um ambiente que sugeria algo mais intimista, mesmo acústico. Mas não mudamos o formato do show. Fizemos uma apresentação normal mesmo, tudo plugado. Rolou legal. O auditório é um pouco separado do espaço da loja (até para isolar o som), então os clientes da loja não necessariamente sabiam que havia um show rolando. Mas apareceram espectadores "curiosos", surpresos, clientes da loja, que teoricamente nunca iriam num bar cheio de fumaça (agora não mais) para ver uma banda de rock barulhenta. Esse público é interessantíssimo, e acho que difícil de atingir normalmente.
CV: Para vocês, a Internet ajuda ou atrapalha? Pois há muitos artistas que reclamam da net.
FF: Eu acredito que a Internet ajuda. É uma ferramenta poderosa, considerando que hoje em dia com um investimento financeiro relativamente baixo um artista consegue montar uma carreira e sustentá-la virtualmente. Fazendo bom uso da rede, é possível você distribuir sua música, marcar shows, divulgar novidades e manter coesa sua rede de fãs, expandindo-a o tempo todo. Antigamente, isto é, há 15 anos, estrutura assim dependenderia de uma grande gravadora por trás, injetando bastante dinheiro para estes fins em poucos artistas escolhidos a dedo com objetivos estritamente comerciais. Houve uma democratização do acesso a iniciativas musicais, pois qualquer banda consegue disponibilizar seu trabalho para o mundo, coisa impensável quando tínhamos que gravar fitas k7 demo e enviá-las pelo correio, uma a uma. Vendo dessa maneira, não tem como pensar que a Internet atrapalha. Agora, vendo por outro lado, essa "democratização" também permite a muitas iniciativas de baixa qualidade que consigam uma projeção desproporcional ao seu trabalho. Isto é, a net às vezes coloca lado a lado artistas muito bons e jovens que nem sabem tocar direito, artistas com carreiras longas e de muita qualidade com moleques que gravaram sua primeira demo tosca em casa no fim de semana passado. Qualquer um que entenda um pouco de Internet e programação consegue criar um artista, em meia hora, e lançá-lo na rede. Então, num oceano de infinitos artistas e iniciativas, sobra para o ouvinte, consumidor, em casa, ouvir, procurar e triar o que tem qualidade do que não tem. É muita gente com diferentes intenções disputando atenções. Tem artistas que não gostam dessa perspectiva, dessa "bagunça". Eu gosto de pensar que a net possibilita a qualquer um no mundo o acesso intantâneo à minha música. Tem um outro ponto, em que a Internet pode parecer injusta. A quantidade de artistas disponíveis a um clique faz com que às vezes não demos a devida chance a um artista, isto é, ouvimos 30 segundos de sua música e já pulemos para ouvir outra banda. Antigamente, de posse de um vinil ou um CD, ouvíamos o disco todo, várias vezes, e aí formávamos uma opinião, muito mais fundamentanda. Hoje matamos ou glorificamos um artista por segundos de uma música. Parece injusto, em qualquer sentido. Mas a Internet ainda vai suscitar muitas discussões, prós e contras. Temos que nos adaptar ao que acontece. É a evolução.
CV: Frebs, além da Radiare, você está tocando em um projeto paralelo. Além de você, tem mais algum integrante da banda que tem projeto solo? E como vocês lidam com isso?
FF: Todos da banda tem outros projetos. Eu tenho a Máquina Voadora (www.maquinavoadora.com.br), na qual toco baixo, o Paulo e o Victor tem a Nüe (http://www.myspace.com/bandnuer) e o Maurício a Del-O-Max
(http://www.del-o-max.com.br). É muito tranquila a relação com os projetos paralelos, pois nenhuma das agendas das bandas é muito sobrecarregada de maneira a dificultar os ensaios ou shows das outras. Se acontecer de algumas das bandas ir demandando mais atenção, a gente vai adaptando as outras. Mas isso subentende coisas boas acontecendo, o que seria ótimo.
CV: Uma pergunta que você pode considerar louca, mas, você acredita que o lance do Brasil sediar a Copa e Olimpiadas, isso, direta ou indiretamente, pode dar uma erguida na cena rock do País, já que as atenções estarão voltadas para cá?
FF: Acho que indiretamente, nos grandes centros, onde vão rolar os eventos esportivos, pode ser que as programações musicais fiquem mais infladas nesses períodos, aumente um pouco as possibilidades de shows ou exposições. Mas os artistas terão que ficar antenados e buscar as situações, como é a maneira que sempre funcionou. A diferença é que a receptividade de organizadores e patrocinadores de eventos pode ser maior, pois haverá grande quantidade de turistas no País. Quanto a "erguer a cena rock", acho difícil, pois pressupõe que a cena como um todo poderia se dar bem com isso, o que é improvável pois não existe unidade ou uma organização conjunta. A não ser que fervilhem grandes festivais no País durante esses eventos, estimulados e promovidos por situações ligados a esses eventos esportivos, ou aproveitando a atenção que eles trariam ao País. Mas é utópico ainda, até que exista algum movimento ou idéia de produtores nesse sentido.
CV: Como é fazer rock atualmente no Brasil. Quais os objetivos da Radiare e seus planos para o futuro?
FF: Existem vários tipos de rock e de bandas de rock no País. Eu já passei por diversos cenários, e sei que hoje em dia, dependendo da proposta, do nicho comercial e da postura da banda, do envolvimento dos integrantes e do desprendimento de suas vidas pessoais, é possível uma banda se lançar e tentar manter uma carreira vivendo da banda. Cada vez mais. Já vemos criado um nicho comercial para alguns tipos de banda de rock, principalmente os mais adolescentes. Existe um sem número de bandas de rock de outros tipos, excelentes, que topam existir e se dedicam a ser uma banda apenas pela paixão à música. O circuito alternativo, embora já exista, seja crescente e abrace essas bandas, ainda é instável a ponto de fazê-las auto-suficientes. Muitas das bandas legais que vemos na MTV, Rolling Stone e MySpace são formadas por pessoas apaixonadas, mas que não estão nem perto de conseguir viver da música que fazem. São designers, bancários e garçons. O mercado brasileiro está crescendo e se abrindo muito para diversos estilos e propostas musicais, mas acredito que no rock ainda seja assim para a maioria, embora o conceito de rock, com as misturas de estilos que vemos por aí e que são bem recebidas pelo público independente do rótulo, também esteja cada vez mais confuso. Nossos objetivos são realistas, acredito. Eu ficaria satisfeito se pudéssemos nos manter em atividade, compondo e conseguindo gravar com uma constância regular e com qualidade, e que tivéssemos um meio consolidado para ir soltando nosso trabalho para o meio. A grande ambição, talvez esta não muito realista, seria conseguir viver e manter a banda apenas com nossa banda. Mas, se pudermos gravar mais uns três ou quatro discos e conseguirmos disponibilizá-los eternamente para as pessoas, eu já me sentirei muito satisfeito. Estamos compondo e ensaiando objetivando material para um segundo disco. E a ideia hoje é ir montando um show consistente com material do primeiro disco recém-lançado e músicas novas. Atualmente as apresentações possuem este formato.
CV: E qual a importância dos blogs, zine e rádios pela Internet?
FF: A importância hoje é imensa, no sentido de triar o material vasto que se têm por aí, do qual falei numa das questões acima, e encontrar o que existe de qualidade, criticá-lo e apresentá-lo contextualizado para o público. Faz muita falta hoje em dia uma opinião e uma sugestão. Muita gente está perdida dentro da quantidade de bobagem a que as pessoas são expostas. Antigamente os zines e rádios tinham acesso à informação privilegiada e a repassavam a um segmento específico, carente daquela informação, para colocá-lo a par das novidades e lançamentos. Hoje em dia qualquer um tem o acesso à infomação. Basta buscá-la na rede. Mas as pessoas não fazem isso, ou fazem mal, e então preferem e agradecem quando existem iniciativas que façam isso por ela, com opinião e qualidade. Os blogs, zines e rádios pela Internet fazem isso. Selecionam o grande e diverso material que existe na rede e no mercado, intrepretam, enriquecem (como no caso dessa entrevista) e o disponibilizam às pessoas com o selo de qualidade da opinião do zine, da rádio ou do blog. Hoje em dia, com a democratização da net, da informação e da novidade, esse papel é valiosíssimo. É um serviço de opinião especializada.
Foto da banda ao vivo por: Alessandra Luvisotto
As outras fotos estão com créditos no "corpo"
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